segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Mary Shelley (2017)


Em 1813, Mary Wollstonecraft Godwin (Elle Fanning), durante uma estada na casa de William Baxter (Derek Ridell) e sua filha Isabel Baxter (Maisie Williams), na Escócia, conhece o poeta Percy Bysshe Shelley (Douglas Booth), por quem se apaixona.
Depois de retornar para casa, Mary somente retornaria a ver Percy quando este se torna protégée de seu pai, William Godwin (Stephen Dillane). Mary Godwin, como sua mãe, gosta de escrever e constantemente transcreve os livros escritos dela, sem ter uma identidade de escrita própria.
Mary se envolve em um enorme escândalo para sua época, pois Percy Shelley era casado com Harriet Shelley (Ciara Charteris), com quem tinha uma filha. Ela decide então fugiu com Percy, levando sua irmã Claire Clairmont Godwin (Bel Powley) consigo.
Passando por desespero, desconfiança, perda e descoberta, Mary viaja com sua irmã – então grávida – e Percy Shelley para Genebra, onde passariam um tempo em uma mansão, a Villa Diodati, alugada por Lord Byron (Tom Sturridge), um bom vivant e libertino que viajava com o jovem médico, John Polidori (Ben Hardy). Lá, durante uma noite de chuva, eles são desafiados por Byron a criar uma história de terror. Então, após ter tido um pesadelo horrível, Mary concebe uma das maiores obras literárias de terror do século XIX, se tornando uma das maiores escritoras de sua época.
“Mary Shelley” é a história da criadora de Frankenstein. Nela vemos Elle Fanning interpretando a protagonista de forma estupenda. Lógico que o filme tem sua própria interpretação da história, dando mais volume a luta das mulheres por reconhecimento, algo que já vinha acontecendo desde o final do século XVIII.
Mulheres escritoras não possuíam reconhecimento em meio a sociedade paternalista e machista, elas tinham de fazer publicações anônimas ou aceitar que homens tivessem o reconhecimento de suas escrituras. Uma dessas mulheres, que lutou pelo direito de ter reconhecimento, foi Mary Wollstonecraft (1759-1797). A mãe de Mary Shelley era uma filosofa e escritora feminista que escreveu “A Vindication of the Rights of Woman”, em busca dos direitos das mulheres. Seu marido, William Godwin (1756-1836), era um árduo lutador pelos direitos das mulheres assumirem as titulaturas de suas obras. Ele, um anarquista, conseguiu com que as obras de sua esposa fossem reconhecidas com dela e, depois, conseguiu o mesmo por sua filha, Mary Shelley.
A vida de Mary Shelley não foi fácil, pois ao se envolver com Percy Shelley, terminou causando um grande escândalo na sociedade inglesa. Percy Bysshe Shelley era de uma família abastada. Seu pai era membro do parlamento e sua mãe possuía terras. Após o escândalo, ele perdeu sua herança, ficando somente com o dinheiro de suas publicações, o que não era muito. Ele era um devoto a boêmia, se envolvendo com uma classe de poetas não bem quista. As coisas somente pioraram quando sua irmã terminou engravidando de Lord Byron, pois ele não queria o filho. Tudo isso, mais a perda de um filho, levaram Mary a compor sua obra única e, porque não, máxima.
Percebe-se no filme de onde vem as ideias que ela tem para a composição de Frankenstein. A visita a exposição “Fantasmagoria”, onde ela vê um sapo reagir a estímulos elétricos. Sua depressão após a perda da filha, sua decepção com o marido, a frustração de sua irmã com a recusa de Byron. Tudo é demonstrado em “Mary Shelley”. Um dos pontos máximos do filme foi a visita de John Polidori – que pode ou não ter ocorrido – mostrando o que acontecera com sua obra “O Vampyro”, a primeira obra literária ocidental com os bebedores de sangue.
“Mary Shelley” deve ser assistido por amantes da literaturas, amantes de filmes de terror, bem como por mulheres que acreditam e creem que possuem mais direitos do que lhe são dados, pois a luta de Mary Shelley por seu reconhecimento é bem explicito no cenário do filme.

quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Papillon (2018)


Henri “Papillon” Charrière (Charlie Hunnam) era um arrombador de cofres quando foi acusado injustamente do assassinato de um gigolô e, por causa disso, foi destinado a uma colônia de prisioneiros na Guiana Francesa, onde conheceu Louis Dega (Rami Malek), um milionário que foi acusado de falsificação. Como foi condenado a prisão perpétua, Papillon somente tinha um objetivo, a liberdade, e lutaria por isso até quando suas forças permitissem.
Baseado nos livros “Papillon” e “Banco” de Henri Charrière, o filme “Papillon” conta como o personagem título conseguiu sobreviver as colônias prisionais da Guiana Francesa, de St. Joseph’s e da Ilha do Diabo, o último destino de Charrière. O impressionante da história não são somente as fugas de Papillon, mas também o enorme laço de amizade que ele criou com Louis Dega. Também temos a esperança no ar, de várias formas. Dega tinha esperanças de liberdade através de uma apelação de seu advogado e sua esposa, Papillon tinha esperanças de liberdade através da fuga, assim como vários outros prisioneiros, mas a diferença era saber como mantê-la, algo que ele soube.
Daí entro no sentido de comparação. Em 1973, o diretor Franklin J. Schaffner dirigiu o filme “Papillon”, com base no roteiro escrito por Dalton Trumbo e Lorenzo Semple Jr. No filme ele contava a mesma história de Charrière, sua prisão, sua amizade com Dega, suas tentativas de fugas e, a partir daí, existem as diferenças, pois no filme de Schaffner percebe-se um maior aprofundamento no livro, pois existem detalhes entre os dois filmes bem distintos. Aaron Guzikowski preferiu concentrar-se mais nos objetivos de Charrière do que no panorama geral, ago que Trumbo e Semple Jr. fizeram. Já a direção de Michael Noer é bem realizada. Ele consegue trabalhar as atuações de todos os personagens de forma bem centrada em seu objetivo.
Não julgarei atuações, pois comparar Charlie Hunnam e Rami Malek com Steve McQueen e Dustin Hoffman seria ousado demais da minha parte e não tenho esse objetivo. Para mim, as atuações de Hunnam e Malek são bem satisfatórias e bem dentro do contexto da história. Me impressiono muito com o trabalho de Malek que a cada dia que passa demonstra seus um ator formidável. Seus dois trabalhos desse ano somente me alegraram.
Em uma apuração final, “Papillon” se perde devido a objetividade do roteiro e não em um aprofundamento maior, fazendo uso mais extensivamente da história de Henri Charrière, que demonstrou saber como sobreviver aos verdadeiros infernos prisionais da sua época.

domingo, 11 de novembro de 2018

Bohemian Rhapsody


Todas as pessoas que gostam do Queen – e principalmente seus fãs – conhecem a história da banda. Sabem que Brian May (Gwilyn Lee) e Roger Taylor (Bem Hardy) possuíam uma banda antes de conhecerem Freddie Mercury (Rami Malek). Sabem das extravagâncias de Freddie Mercury no palco e fora dele. Sabem de sua opção sexual de Mercury – batizado Farrokh Bulsara, na religião zoroastriana. Sabe que teve relações com homens e mulheres e que seus principais parceiros, com quem casou foram Mary Austin – de 1970 a 1976 – e Jim Hutton – de 1985 até o dia de seu falecimento. Sabem que ele faleceu das consequências da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida. Mas o quanto conhecem dos bastidores disso tudo?
Com direção de Bryan Singer, baseado no roteiro de Anthony McCarten – que escreveu a história ao lado de Peter Morgan –, está nos cinemas, “Bohemian Rhapsody – A História de Freddie Mercury”.
O subtítulo dado no Brasil, “A História de Freddie Mercury”, não é o que eu consideraria o ideal. Sim, temos um roteiro mais centrado no vocalista do Queen, mas a história em si parte do momento que May e Taylor após uma festa que eles tocavam com sua banda. Após seu vocalista os abandonar, Freddie lhes fala sobre seu desejo de fazer parte da banda e assim começa a parceira. Com a introdução de John Deacon (Joe Mazzello) nos baixos, a banda decide inovar. Primeiro mudam o nome da banda, depois começam a compor músicas que mais têm a ver com eles. A música que dá título ao filme, “Bohemian Rhapsody” é colocada como o divisor de águas de um momento do grupo, pois é o momento em que eles se tornam mais autossuficientes e assumem o destino de sua carreira.
Um dos maiores pecados do filme, para mim, é os erros cronológicos. Um dos maiores exemplos é a apresentação do Queen no Brasil.
Sinceramente, teria sido fantástico que o grupo inglês tivesse se apresentado na década de 1970, no Rio de Janeiro, com o Maracanã extremamente lotado, mas, como brasileiros, sabemos que o momento culminante da banda no Brasil foi durante o primeiro Rock in Rio, de 1984, onde eles tocaram seus maiores sucessos com o público cantando junto, principalmente, “Love of my Life”. Mas sabemos que coisas desse tipo ocorrem em filmes biográficos, fatos sempre se tornam irrelevantes no período de seus acontecimentos. Mas nem por isso, “Bohemian Rhapsody” perde sua beleza, pois temos ali vários pontos crucias da banda sendo colocados para nosso conhecimento. As composições de músicas, os momentos de crises de Mercury, suas brigas e desentendimentos com a banda. Sua “descoberta” de sexualidade. Sua descoberta da AIDS. E todos os momentos maravilhosos e mágicos da banda.
Eu nunca disse ser fã do Queen, mas sempre fui um admirador assíduo da banda, essencialmente no período que Freddie Mercury foi membro. Não sei se considerarão como spoiler – acho que já soltei alguns, peço desculpas por isso – mas não mostram os momentos finais de Freddie, e acho o mais correto a ser feito, pois o mais importante é sabermos o quanto esse artista brilhou e o legado que deixou. Sua voz, sua música, para sempre encantarão os admiradores, os fãs e toda uma velha – e por que não nova – geração que sempre escutará e agradecerá por Freddie e o Queen terem existido e trabalhado em uníssono.
Quanto ao trabalho de elenco – lógico, não poderia deixar de mencionar – temos que admirar cada dia mais o trabalho de Rami Malek. Começou com trabalhos menores até se tornar o protagonista da série “Mr. Robot”. Alguns duvidavam de sua possibilidade de encarar um personagem tão cheio de personalidade como Freddie Mercury, mas ele demonstra ser totalmente capaz de encarar o papel e o torna bastante crível. O mesmo posso dizer com a atuação Gwilin Lee, Ben Hardy e Joe Mazzello que interpretam Brian May, Roger Taylor e John Deacon, respectivamente. O grupo se torna totalmente verossímil nas telas e, como eu havia dito, temos também os problemas de cada membro sendo citados na decorrência da película.
“Bohemian Rhapsody” vai além da história do Freddie Mercury, narrando o Queen em sua formação original e tudo que pode ser dito para a formação de uma das maiores bandas do mundo.

segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Insubstituível



Em 02 de setembro de 2018 perdemos um dos maiores marcos de pesquisa e história do Brasil, o Palácio de São Cristovão, localizado no Parque da Quinta da Boa Vista, sede do Museu Nacional desde 1892. Nele vários acontecimentos históricos ocorreram, como a assinatura da Declaração de Independência do Brasil do domínio de Portugal, também em seu interior, para demonstrar o fim do Império e o começo da República, foi assinado a Primeira Constituição Republicana do Brasil.
Em 1942, durante o governo do presidente Eurico Gaspar Dutra (1946-1951), o Museu Nacional passou a ser administrado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Em 06 de junho de 2018, o Museu Nacional completou dois séculos de existência e, mesmo passando por vários problemas estruturais, era ponto turístico costumeiro do Rio de Janeiro, tendo várias visitações. Além disso, servia de sede de várias pesquisas científicas que eram ligadas a botânica, entomologia, geologia, gemologia, etnologia, arqueologia, zoologia, entre outros. Seu acervo tinha um total de 20 milhões de peças, mas com a perda, perdeu-se muito dele.
Em uma campanha iniciada pela administração do Museu Nacional e seus pesquisadores, intitulada Museu Nacional Vive, várias partes do que sobreviveu e foi resgatado do acervo, foi apresentado ao público nos dias 22 e 23 de setembro de 2018.
A constante busca para manter a memória do que se perdeu, vem surgindo em redes sociais com o hashtag #museunacionalvive, dentre elas veio da Mauricio de Sousa Produções.
A empresa, fundada por Mauricio de Sousa em 1959, tem vários personagens criado pelo seu fundador, dentre eles a Turma do Penadinho que é constituída por personagens sobrenaturais que vivem em um cemitério e tem histórias que variam de comédia a conscientização. A Turma do Penadinho já prestou várias homenagens a personalidades que faleceram, como o Papa João Paulo II.
Com a perda do patrimônio de pesquisa e história do Brasil, a Turma do Penadinho retornou para prestar mais uma linda e maravilhosa homenagem ao Museu Nacional, localizado no Palácio de São Cristovão, na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro. Com roteiro de Flavio T. Jesus, desenho de Jairo A. Santos, arte-final de Kazuo Yamassake e letras de Eliza T. K. Lacerda, a turma começa um resgate de nossa memória, trazendo as peças e objetos que se encontravam no interior do Museu. Do meteoro de Bendegó ao crânio de Luzia, várias são as peças que eles prestam homenagem e, possivelmente, se perderam no incêndio criminoso* que ocorreu no interior do Palácio. A Mauricio de Sousa Produções está de parabéns por essa linda homenagem.





P.S.: Agradeço a Sidney Gusman, Mauricio de Sousa e Mônica de Sousa por me permitirem fazer essa postagem.


* Devido ao descaso do governo federal, durante anos, com o Museu Nacional e seu patrimônio, EU considero como criminoso o acontecido.

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Assassinaram a cultura do nosso país.


Eu fico aqui, pensando e repensando em como vou expressar minha revolta com o que aconteceu no dia 02/09/2018 ao Museu Nacional do Rio de Janeiro.
INCÊNDIO NO MUSEU NACIONAL EM 02/09/2018
Quando eu recebi a notícia pela primeira vez, através de um post no Instagram, não quis acreditar, pensei que fosse algo antigo e que estavam relembrando, como o incêndio do Museu de Arte Moderna em julho de 1978 ou o incêndio no Instituto Butantã em maio de 2010 ou o incêndio no Auditório Simón Bolívar, no Memorial da América Latina, em novembro de 2013 ou o incêndio ao Museu da Língua Portuguesa em dezembro de 2015, mas não, era pior, bem pior... Por quê?
MARIA LEOPOLDINA EM UMA REUNIÃO COM O ESTADO, NA
DECISÃO DA INDEPENDÊNCIA DO BRASIL, EM 02/09/1922
Bem, o Palácio foi criado durante o reinado de D. João VI, servindo de moradia para sua família, até ele partir com sua esposa e seus filhos para Portugal, deixando lá seu segundo filho – e seu sucessor ao trono – Pedro de Alcântara. Em 02 de setembro de 1822, o Palácio serviu de principal local para o início do que viria a ser a independência do país, pois a princesa regente interina, Maria Leopoldina assinou o decreto da independência do país. O local também serviu como palco para a primeira Assembleia Constituinte Republicana do Brasil, em 1889, dando início a Velha República.
AQUARELA QUE REPRESENTA A ASSINATURA
DO PROJETO DA CONSTITUIÇÃO REPUBLICANA DE 1891
Em 1892, o Palácio foi transformado em Museu – o MuseuNacional já existia desde junho de 1818, criado por D. João VI no Campo de Santana – e em 1938 foi tombado como Patrimônio Histórico pelo IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional). Dessa forma, podemos ter aí mais de 200 anos de história desse local. Nele existiam um “acervo de mais de 20 milhões de itens, (destacando-se): a coleção egípcia, que começou a ser adquirida pelo imperador Dom Pedro I; a coleção de arte e artefatos Greco-romanos da Imperatriz Teresa Cristina; as coleções de Paleontologia que incluem o Maxakatisaurus topai, dinossauro proveniente de Minas Gerais; o mais antigo fóssil humano já encontrado no país, batizada de “Luzia”, (...); (as) coleções de Etnologia (...) expostos objetos que mostra(vam) a riqueza da cultura indígena, cultura afro-brasileira, cultura do Pacífico e na Zoologia destaca(vam)-se a coleção Conchas, Corais, Borboletas, que compreende o campo de invertebrados em geral e, em especial, dos insetos”.
MUSEU NACIONAL - VISÃO AÉREA
Não estou tentando minimizar as outras perdas que, como o Museu Nacional, prejudicam a memória e a cultura de nosso país, mas diferentemente dos outros, são 200 anos de história que foram destruídos. Tá, alguns dirão que nem tudo foi destruído, pois a Biblioteca Central não foi atingida pelo fogo e, possivelmente, o que estava no subsolo sobreviveu ao incêndio. Mas isso corresponde a, somente, 10% dos itens que estavam no Palácio.
Sem contar que as denúncias não vêm de hoje.
"MEMÓRIA EM CINZAS", MINIDOCUMENTÁRIO DA GLOBONEWS
SOBRE O INCÊNDIO DO MUSEU NACIONAL
No minidocumentário do Globo News, “Memória em Cinzas”, no dia 03/09/2018, foi mostrado que várias foram as matérias a respeito das condições do Museu Nacional. Então as palavras “acaloradas” do ministro Carlos Marun de que “Agora tem muita viúva chorando. Não tenho visto ultimamente alguém destacando a história do museu para torná-lo mais amado. Está aparecendo muita viúva apaixonada, mas essas viúvas não amavam tanto assim o museu”, não tem verdades. Falta ao ministro uma melhor fonte de informações ou, talvez, assistir mais telejornal.
Também, lembrado pelo The Guardian, em 03/09/2018, “[...] os governos são os culpados por não apoiar o museu e deixá-lo cair em desuso. No seu 200º aniversário em junho, nenhum ministro do Estado apareceu”, ou seja, o descaso sempre foi claro e o desinteresse, também.
Daí surgiram as matérias falando sobre de quem é a culpa? E, sinceramente, não tem como redimir ninguém, mas vale lembrar que os repasses que o governo federal do Brasil faz para a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), responsável pela manutenção do Museu Nacional, está ligado a várias coisas.
A UFRJ é responsável pelo salário de vários professores e profissionais que trabalham em seu campus. Esses professores têm reajuste anuais como todos profissionais. Mesmo que serviços sejam terceirizados, há necessidade de pagar as empresas para que os serviços sejam mantidos. Em matéria publicada em 04/07/2017, referente ao Orçamento daquele ano, foi falado sobre uma redução no percentual em 6,7%, e ainda que “O MEC já bloqueou parte do orçamento e informou que poderá haver contingenciamento de 10% a 15% de custeio, 15% a 20% de receitas próprias das universidades e de 30% a 40% de capital. Se confirmado, a UFRJ perderá o equivalente a dois meses de suas contas. É importante lembrar que em 2016 muitas contas somente foram pagas até o mês de setembro, deslocando o pagamento das despesas não pagas para o orçamento de 2017”. Então, mesmo que ele tenha recebido a mais no ano de 2017, devido aos reajuste determinado pela PEC 55/16 (Institui o Novo Regime Fiscal no âmbito dos Orçamentos Fiscal e da Seguridade Social da União, que vigorará por 20 exercícios financeiros, existindo limites individualizados para as despesas primárias de cada um dos três Poderes, do Ministério Público da União e da Defensoria Pública da União; sendo que cada um dos limites equivalerá: I - para o exercício de 2017, à despesa primária paga no exercício de 2016, incluídos os restos a pagar pagos e demais operações que afetam o resultado primário, corrigida em 7,2% e II - para os exercícios posteriores, ao valor do limite referente ao exercício imediatamente anterior, corrigido pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – IPCA. Determina que não se incluem na base de cálculo e nos limites estabelecidos: I - transferências constitucionais; II - créditos extraordinários III - despesas não recorrentes da Justiça Eleitoral com a realização de eleições; e IV - despesas com aumento de capital de empresas estatais não dependentes.), o valor não foi o suficiente para todos os gastos da universidade. Isso já foi uma determinação do governo Temer, que hoje busca jogar toda a responsabilidade – que também não deve ser reduzida – para o governo da ex-presidente Dilma Rousseff.
A ex-presidente, também, fez indiferença com os patrimônios públicos do nosso país, pois como mostra a reportagem do “Hoje em Dia” de 02/05/2016, a presidente destinara aos eventos da Copa do Mundo (2014) e Olimpíadas (2016) um valor de R$ 39,5 bilhões para os gastos de infraestrutura do país para receber as delegações de outros países.
Somados, os custos para a realização da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016 são de aproximadamente R$ 66 bilhões. Desse montante, mais da metade (R$ 39,5 bilhões) saíram dos cofres públicos. No entanto, na avaliação de especialistas, os investimentos bilionários para os megaeventos esportivos não trazem ganhos significativos para o desenvolvimento do país.
“Se comparado a outras demandas atuais, o dinheiro gasto na Copa e na Olimpíada seria suficiente para cobrir duas vezes o valor que o governo pretende arrecadar em 2017 com a volta da CPMF, cerca de R$ 33,2 bilhões por ano. A mesma quantia poderia suprir, ainda, o déficit no orçamento da União em 2016, que será de R$ 60,2 bilhões, segundo o Ministério da Fazenda”.
Sim, fomos o país da Copa. Sim, fomos o país das Olimpíadas. Mas e aí? Com todo esse valor gasto, as quedas orçamentárias foram sentidas e sempre prejudicaram o nosso patrimônio, pois apesar de termos sido país disso ou daquilo, isso passa, mas nossa memória não (pelo menos, não deveria).
Mas as reivindicações não vêm de hoje. Como dito acima, no minidocumentário da Globo News, ´”Memória em Cinzas”, mostraram anos de descaso com o Museu Nacional do Rio de Janeiro. O Palácio teve goteiras, infiltração, cupins e – quase – todo o acervo da Biblioteca precisou ser transferido para outro prédio por falta de condições de abrigar obras como os Pergaminhos de Ivriim, uma coleção de nove rolos da Torá, compilados em hebraico, comprados por D. Pedro II em 1877. Foram anos e anos de diretores, vice-diretores e diretores adjuntos exigindo providências do Estado para melhorias do espaço. Por consciência e ciência de que alguns produtos se deterioram por causa de micro-organismos, os trabalhadores e pesquisadores que constantemente estavam no Museu Nacional, precisaram fazer uma vaquinha para contratar uma empresa para fazer a limpeza do local. As múmias e seus sarcófagos, que precisavam de ambiente próprio para serem conservadas, estavam em decomposição. PENSEM! Essas múmias sobreviveram às intempéries de milhões de anos, para começar a se deteriorar em um museu, em um local onde deveriam ser admiradas e estudadas em ambientes próprios para sua conservação.
DR. LEANDRO KARNAL
O Dr. Leandro Karnal, historiador de renome, com várias obras escritas e dedicadas a história da humanidade, que atualmente atua como professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) na área de História das Américas, deu uma entrevista ao BandNewsFM, no dia 03/09/2018, onde falou que “Era uma anacrônica de uma morte imediata. (...) Não apenas queimamos um patrimônio inestimável, mas também era um prédio histórico. (...) Tudo se perdeu por descaso ao patrimônio nacional. (...) A perda da memória é irreparável. Não é como uma crise econômica, que em 10 ou 20 anos a gente pode recuperar, não é como repor emprego, que é um problema grave no nosso país; estamos falando da perda de peças que nunca mais poderão ser colocadas lá. (...) Quantos mais terão de se incendiar para que alguém tome uma providência. (...) O que se perde não pode ser reposto”. E foi mais a fundo, falando sobre como nossos governos, desde o final da década de 1970, vem tratando nossa cultura. “A Cultura recebeu cortes. (...) Existe um projeto de desmontar a memória brasileira. Um projeto para desmontar aquilo que pode olhar criticamente (...) uma série de estratégias para a destruição do patrimônio histórico brasileiro”.
Sabemos disso tudo que o nobre historiador falou, mas o que fazemos? NADA. A mentalidade do brasileiro sempre foi a seguinte: “Está ali, que bom, mas é velho, para que preservar algo que é velho?”, “Deveriam demolir essas coisas velhas e construir algo mais moderno”. “Por que não digitalizaram tudo. Se tivessem digitalizado, nada teria se perdido”. E assim vai.
A pesquisa, o desenvolvimento de novas descobertas, de novos aprendizados, sempre se perde quando espaços dedicados a eles são incendiados, alagados, depredados, abandonados.
Desde 1978, o Museu Nacional vinha requerendo assistência e um melhor apoio do Governo Federal. Nas reportagens abordadas em “Memória em Chamas”, temos reivindicações desde o final da década de 1970 até mais recentemente, em maio de 2018, quando foi necessário remover a ossada do maior bicho-preguiça já encontrado, pois estavam com problemas de cupins, algo antigo, que o museu vinha combatendo com uma empresa terceirizada, contratada. Mas a empresa parou de prestar serviços por falta de dinheiro.
O que ocorreu, acontecerá novamente, pois mesmo que o atual presidente ou um dos candidatos as eleições que poderão assumir, prometam algo, eles não farão muito.
No momento, as mídias estão falando sobre o assunto, então uma abordagem mais ampla está sendo dada. Os presidenciáveis demonstraram seus lamentos quanto a perda (com exceção de alguns que não se pronunciaram), como mostra no Correio Braziliense. Mas até quando ficaremos somente no lamento e uma atitude será tomada? Retomando as falas do Dr. Karnal, também acredito na existência de um projeto de desmontar, destruir a memória nacional, pois assim as pessoas tendem a crer no que um político expressa, enganando-se e não reconhecendo seu passado. Então as falas dos políticos sempre serão a mesma, de pesar, de acusações dos seus predecessores. Mas será que eles farão mesmo algo?
MUSEU DO IPIRANGA
Em 2022, o Brasil completará 200 anos de Independência do Brasil, mas o patrimônio ligado à independência do nosso país, o Museu do Ipiranga (também conhecido como Museu da Independência), encontra-se de portas fechadas desde 2013, devido a infiltrações e risco de queda do teto e, ainda em 2018, cinco anos após seu fechamento, nada foi feito. Havia uma previsão de começo das obras nesse segundo semestre deste ano, mas agora foi transferido para 2019. A Universidade de São Paulo (USP) buscará captar os recursos, orçados entre R$ 80 e 100 milhões, na iniciativa privada, pois não conseguirá com o governo o necessário para que poder reabrir o museu a tempo do jubileu. O mesmo governo que vem acusando a UFRJ de culpa pela negligência com o Museu Nacional.
Sabe qual é a nossa sorte? Mesmo que não tenhamos nosso governo se importando em auxiliar nosso patrimônio – ah sim, do nada surgiram R$ 10 milhões de um fundo emergencial para ajudar na reconstrução do Museu Nacional –, outros países se importam.
Logo após ter ciência do incêndio, o presidente de Portugal apareceu diante das câmeras declarando apoiar e auxiliar o Brasil no que ele precisar. Interessante isso, pois o atual presidente do Brasil, Michel Temer, se esconde atrás dos ministros da Cultura e da Educação, deixando-os determinar o que fazer pelo bem do Museu Nacional, enquanto o governante de outro país não poupa esforços para ele mesmo aparecer diante das câmeras e falar no auxílio ao nosso país, pois dividimos algo semelhante, tivemos o mesmo rei, D. João VI. Aquele que nos deu a independência, que foi nosso primeiro imperador, depois se tornou rei para eles, D. Pedro IV (para nós D. Pedro I). O herdeiro deste foi nosso imperador, D. Pedro II, até que ele teve de abdicar do trono para que nascesse nossa República. E, sinceramente, esse é o comportamento de um governante que se importa com o patrimônio cultural da humanidade.
No dia 06/09/2018, O G1 publicou que o Ministério do Exterior da Alemanha pretende auxiliar a reforma do Museu Nacional com uma verba emergencial de € 1 milhão (algo em torno de R$ 4,8 milhões).
“[...] o Ministério alemão do Exterior informou que coordenará esforços nacionais para fornecer apoio à limpeza e recuperação do Museu Nacional no Rio de Janeiro, (...).
A secretária de Cultura do Ministério do Exterior alemão, Michelle Müntefering, se reunirá com autoridades do governo, estados e da sociedade civil para discutir a ajuda emergencial.
Segundo Müntefering, especialistas alemães participarão de uma missão da Unesco no Museu Nacional no Rio, na tentativa de recuperar itens que podem ter sido poupados pelas chamas”.
Tá, passamos por uma crise tremenda na economia do país, mas volto a lembrar, se tivessem cuidado do nosso patrimônio quando deveriam, não estaríamos tendo um auxílio externo, inicialmente. Pelo contrário, essas pessoas estariam vendo, lá fora, que sabemos cuidar do que é nosso.
Esse texto não parece que terá fim. Ficou longo, eu sei, mas preciso expor essa revolta que me corrói por dentro. Essa revolta que não passará.
Meu estado, o Espírito Santo, tem um total de 80 museus, três deles mantidos pelo governo estadual e os outros setenta e cinco pelos municipais. Alguns encontram-se em condições razoáveis graças ao esforço constante daqueles que trabalham no seu interior. Pesquisadores, cientistas, continuam trabalhando no interior desses museus, batalhando para preservação de seus bens. Artefatos de vários períodos da História do Brasil e do Espírito Santo.
Eu poderia esperar que os próximos governadores e presidente façam algo, mas não vou me iludir, não serei tão inocente. Nosso passado foi arruinado, feito em chamas em poucos minutos. Novas descobertas foram impossibilitadas. Não há arquivos digitalizados que possam recuperá-los. Não a reconstruções e escaneamentos em 3D que refaçam o que se perdeu. Foi a nossa história, a histórias de gerações e do mundo que partiu nas mãos incapacitadas dos nossos governantes. Nossa cultura e nosso passado foi assassinado e a culpa é de quem, DE TODOS NÓS! Aceitem esse fato, pois assim continuará sendo.